domingo, 5 de agosto de 2007

Os acertos no Fernando Fonseca com os Mellos

Tribunal de Contas iliba responsáveis da ARS

O Tribunal de Contas absolveu os responsáveis da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARS-LVT) no caso do acerto de contas do Hospital Fernando Fonseca com o grupo Mello. O processo arrasta-se desde 2001 e estava em causa a responsabilidade dos administradores no pagamento indevido de cerca de 70 milhões de euros ao grupo Mello.


O caso foi despoletado em 2001 por Manuela Lima, então presidenta da ARS-LVT. Questionou pela primeira vez os pagamentos efectuados bem como a interpretação do contrato feita pelos seus antecessores. Na sequência desta interpelação, uma acção da Inspecção-Geral das Finanças detectou 79 milhões de euros pagos indevidamente pela ARS ao grupo Mello.
Pelos factos apurados, o Ministério Público deduziu acusação contra 26 ex-responsáveis da ARS-LVT, excluindo apenas as ex-ministras da Saúde Maria de Belém Roseira e Manuela Arcanjo e os ex-ministros das Finanças Sousa Franco e Pina Moura, que ocuparam as pastas entre 1995 e 2001. Exigiu-lhes indemnizações no montante dos pagamentos indevidos.
Constantino Sakellarides, ex-director-geral de Saúde e ex-presidente da ARS-LVT, considerou em 2003 que a acção inspectiva das Finanças era «um aborto completo de investigação em termos de gestão», segundo noticiou o «Público». Alegou que o problema do Hospital Fernando Fonseca estava no contrato de cedência de gestão a uma entidade privada, que foi «feito à pressa, por razões políticas», pelo último governo de Cavaco Silva.
Mas foi o Governo de Durão Barroso quem enviou, em 2002, o relatório da Inspecção Geral de Finanças para a Procuradoria Geral da República e para o Tribunal de Contas. Todavia, o Ministério da Saúde e o grupo Mello conduziram o processo para o Tribunal Arbitral, uma instância controversa, onde o Estado contestou pagamentos de 75 milhões de euros e os privados exigiram o pagamento de 60 milhões de euros. Todavia, a decisão acomodou-se ao interesse dos privados.
Bernardino Soares, numa declaração produzida em Novembro de 2006, na Assembleia da República, afirmou que «o Tribunal Arbitral foi sempre a tábua de salvação deste negócio», em que as partes «abdicaram, convenientemente, do direito de recorrer da decisão». E acusou todos os responsáveis políticos por nunca terem querido saber das conclusões da ARS presidida por Manuela Lima. «Só quiseram, sempre, saber das conclusões do dito — e sem legitimação legal — Tribunal Arbitral. E, assim, se beneficiou o Grupo Mello em 113 milhões de euros!»
O deputado comunista acusou os governos PSD e PS de nunca terem tido intenção de fiscalizar o contrato de concessão do Hospital Fernando Fonseca. Montou-se, deliberadamente, «um sistema de acompanhamento ineficaz e inexistente, aceitando-se todas as imposições do Grupo Mello, sem discutir».
Salvador de Melo, presidente da José de Mello Saúde, após ser conhecida a decisão do Tribunal Arbitral que favoreceu o grupo, declarou a sua satisfação com a decisão, a qual «é um bom prenúncio para as parcerias público privadas».
Acrescentou que a «decisão dá-nos ânimo para avançarmos com a nossa candidatura a todos os dez novos hospitais públicos que vão ter gestão privada.»
Depois de uma primeira decisão que absolveu a negligência de que iam acusados os responsáveis da ARS, o Tribunal de Contas ilibou agora todos os gestores. A auditoria do tribunal concluiu em 2005 que o Estado pagou indevidamente ao grupo Mello 70 milhões de euros, por cuidados de saúde nunca realizados, facturados em duplicado ou não previstos no contrato.
O Tribunal de Contas alega que o Ministério Público «desvalorizou a auditoria» e imputou responsabilidades de umas equipas a outras. De acordo com o «Diário Digital», a sentença considera que o Ministério Público «contraria o apurado em auditoria» e responsabiliza todas as equipas pela actualização anual de pagamentos, em vez de desagregar estas verbas. Assim como considerou solidárias, responsabilidades que são individuais.
Proposta ganhadora

Animado pelas decisões alcançadas no final de 2006, o grupo Mello teve novas satisfações no início de 2007, quando o ministro da Saúde, Correia de Campos, anunciou que não renovaria o contrato de gestão do Hospital Amadora-Sintra e que lançaria novo concurso público em 2008.
A intenção do Ministério da Saúde é conceder à mesma entidade a gestão do Hospital Fernando Fonseca e a gestão do novo hospital de Sintra. Como existe já um parecer emitido pelo Procurador-Geral da República, esta metodologia torna-se indispensável.
Em declarações ao «Correio da Manhã», em Janeiro deste ano, Rui Raposo, presidente da Sociedade Gestora do Hospital Fernando Fonseca, afirmou que o grupo Mello viu a decisão do ministro como «uma medida muito positiva». Disse que defendem há oito anos a criação de «uma nova unidade de saúde em articulação com a nossa», o Hospital Fernando Fonseca.
O responsável do grupo Mello acrescentou que «iremos apresentar uma proposta ganhadora, porque conhecemos as necessidades da população». Em Fevereiro deste ano, a Câmara Municipal da Amadora, presidida pelo PS, e a Câmara Municipal de Sintra, presidida pelo PSD, tornaram-se accionistas do Grupo Mello Saúde.
A CDU da Amadora considerou que a decisão autárquica constitui um «duplo erro», por acomodação a «um modelo errado de gestão» e por «favorecimento indevido a um concorrente em detrimento de outros».

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