sábado, 23 de junho de 2007

Quatro áreas médicas já maioritariamente privadas

Situação denunciada num relatório que o Governo recebeu há quatro meses.
Há várias especialidades médicas que já estão maioritariamente privatizadas. Apesar de estar previsto na Constituição que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) deve ser tendencialmente gratuito para todos, os portugueses são forçados a pagar a médicos privados quando ficam doentes. A situação é denunciada num relatório que o Governo recebeu há quatro meses e que a TVI divulga, esta terça-feira, na íntegra, aqui na TVI Online.
À cabeça da lista das especialidades médicas que já se tornaram maioritariamente privatizadas, estão os dentistas, que quase não existem nos serviços públicos. Mais de 92% das consultas são privadas.
Na Ginecologia e na Oftalmologia, o cenário repete-se: 67% das consultas destas especialidades são privadas. A Cardiologia é a quarta especialidade médica maioritariamente privatizada - mais de 54%. A Ortopedia, com 45,5% das consultas privadas, é a quinta especialidade a caminho da privatização.
Estes dados constam do relatório do grupo de trabalho nomeado pelo Governo para estudar soluções que garantam a sobrevivência financeira do Serviço Nacional de Saúde. A Oposição, em bloco, está escandalizada porque o documento foi entregue há quatro meses, mas o ministro da Saúde continua a não o pôr à discussão pública.
Os peritos, no relatório, propõem ao Governo corte nos descontos de despesas de saúde em sede de IRS, o que poderá criar um grave problema na saúde oral, uma vez que a maioria dos portugueses é forçada a financiar os dentistas do próprio bolso.
Veja o relatório na íntegra, no blog pessoal do jornalista da TVI Carlos Enes, em http://www.fragmentosdeapocalipse.blogspot.com/.


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    sexta-feira, 22 de junho de 2007

    Dois meses e meio é o tempo que temos para a construir. Postas as coisas assim, uma pessoa que conheça a dimensão e a grandeza da Festa do Avante (mas desconheça como ela é construída) dirá que em dois meses e meio não é possível erguer tamanha cidade. E muito menos é possível, dirá essa pessoa, preencher tal cidade com um tão vasto conjunto de actividades culturais, políticas, desportivas, gastronómicas, de convívio, como o que durante três dias ocorre, todos os anos, na Atalaia - isto para já não falar naquele ambiente de fraterna solidariedade, de camaradagem, de amizade, que faz da Atalaia, durante três dias, o espaço com maior índice de fraternidade por metro quadrado em todo o território nacional. É lá possível, em dois meses e meio, levar por diante tão grandioso e magnífico empreendimento!, só por milagre! – concluirá a tal pessoa. E com algum fundamento, reconheça-se: com efeito, construir uma festa como esta não é tarefa fácil; nem, em condições normais, é possível concretizá-la em tão pouco tempo; nem o tal ambiente é coisa que se decrete com carácter de cumprimento imperativo.
    É claro que se a pessoa em questão passar por lá um fim-de-semana destes e assistir a uma jornada de trabalho (ou, quem sabe?, participar mesmo nela), não duvidará mais: porque ficará a saber como, porquê e por quem é esta Festa construída – e sabendo isso é fácil perceber tudo.
    A Festa do Avante é a festa do PCP e, por isso, é a festa da militância. Não dessa militância que se vê nos outros partidos, feita ao sabor dos ventos que correm e, muitas vezes, em troca de gratificantes contrapartidas pessoais – mas da militância revolucionária assumida, feita da consciência política, partidária e de classe de milhares de homens, mulheres e jovens, portadores do mais belo ideal: o ideal comunista de justiça social, de liberdade, de solidariedade, de paz, de camaradagem, de amizade. E a verdade é que, quem luta pela transformação da sociedade capitalista numa sociedade liberta de todas as formas de opressão e de exploração, transporta consigo fontes de força e disponibilidades de fraternidade e solidariedade inesgotáveis. É essa a força que emerge da Festa do Avante – quer no seu complexo e difícil processo de construção, quer no ambiente vivido durante os três dias da sua duração. É essa a razão pela qual nenhum outro partido nacional – nem todos juntos - é capaz de construir uma festa como esta.E é por isso que a Festa do Avante – Festa de Abril, portanto da liberdade e da democracia – tem sido um alvo preferencial da ofensiva dos partidos da política de direita ao longo dos anos. Uma ofensiva que tem assumido, em cada momento concreto, as características específicas da respectiva etapa da contra-revolução: à bomba, quando, em 1976, essa era a arma dos inimigos de Abril; com a recusa de terreno, nas fases seguintes, e com mil outras tropelias antidemocráticas sempre. Uma ofensiva que continua, assumindo, hoje, novas formas (já que todas as outras fracassaram) e que exige a mesma firmeza, determinação e serenidade com que vencemos as anteriores – ao fim e ao cabo, a mesma firmeza, determinação e serenidade que nos são exigidas nas lutas de todos os dias. Para os inimigos da Festa, ela é um mau exemplo: porque é exemplo de participação consciente, de determinação democrática, de trabalho voluntário e colectivo, de convicções firmes e coerentes, de ampla e fraterna solidariedade – tudo valores dos quais a modernidade dos executantes da política de direita foge como o diabo da cruz.
    Da generalidade dos militantes comunistas que, no terreno, em jornadas de trabalho de fim-de-semana ou de fim de tarde, erguem a imensa e bela cidade que é a Festa – mais os que, nas suas organizações partidárias, por todo o País, a divulgam, vendem as EP’s, organizam deslocações colectivas de visitantes, preparam o recheio dos pavilhões – podemos dizer que são construtores de novo tipo: construtores que sabem que o seu contributo indispensável para o êxito da Festa é parte do seu contributo maior para a concretização das múltiplas tarefas que integram a actividade geral do colectivo partidário. Muitos dos que constroem a Festa foram, igualmente, construtores da poderosa Greve Geral de 30 de Maio e de muitas outras lutas entretanto levadas a cabo em resposta à política de direita ao serviço do grande capital – e são, e serão, construtores de muitas outras batalhas que a situação política nacional continua e continuará a exigir.
    E a seu lado, tanto na construção da Festa como na organização e participação nas lutas, encontram-se muitos e muitos milhares de homens, mulheres e jovens que, não sendo militantes comunistas, sabem, por experiência própria, que nenhum outro partido nacional defende os seus direitos e interesses como o PCP o faz: sempre, em todos os momentos e situações, seja qual for a natureza das dificuldades e dos obstáculos que se lhe deparem.
    Por tudo isto, a Festa do Avante é um espelho da actividade e da forma de funcionar do PCP, dos seus valores, dos seus objectivos, do seu projecto. Ali, no amplo espaço da Atalaia – primeiro, no processo de construção da Festa; depois, na sua concretização em multidão solidária, fraterna, livre e feliz - a intervenção criadora do colectivo partidário mostra que é possível um futuro de liberdade, de justiça social, de paz e de amizade entre os povos - o futuro pelo qual lutamos e de que a nossa Festa, em cada ano, nos mostra um pedacinho.
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    MAIORIA ABSOLUTA EM VENDAS NOVAS

    CDU vence eleições intercalares
    A CDU venceu, no domingo, com maioria absoluta, as eleições intercalares para a Freguesia de Vendas Novas.
    A lista da CDU obteve 2207 votos (58,93 por cento), seguindo-se o PSD, que registou 1013 votos (27,05 por cento). O PS, que sofreu uma «humilhante derrota», passou para a terceira força política, tendo obtido apenas 369 votos (9,85 por cento).
    Em nota de imprensa, a Direcção da Organização Regional de Évora (DOREV) do PCP salienta que esta «vitória», «não está desligada do trabalho, da humildade e da seriedade com que a CDU tratou a questão da Junta de Freguesia de Vendas Novas».«O entendimento entre o PSD e o PS, que impediu a constituição do executivo da Junta de Freguesia após as eleições de 2005, foi condenado agora pela população», afirmam os comunistas, valorizando, por outro lado, o «trabalho e empenhamento» desenvolvido pelos deputados do PCP, pelos eleitos da CDU e muitos outros quadros, «na defesa das urgências e na luta pela reabertura do Serviço de Atendimento Permanente de Vendas Novas».
    Sobre a derrota do PS, a DOREV do PCP acentuou que «é a derrota da arrogância, da prepotência, da falta de seriedade e de solidariedade com a população de Vendas Novas, na luta pelo direito à saúde, mas é também a condenação da política do PS para o concelho e para a região, conforme se verificou na greve geral».
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    domingo, 17 de junho de 2007

    LISBOA PRECISA DA CDU

    Na campanha das eleições intercalares para a Câmara Municipal de Lisboa, voltou à baila, trazido por António Costa, o tema do «sectarismo do PCP» - que é , como se sabe, tema recorrente por parte do PS sempre que, especialmente em campanhas eleitorais, quer justificar a inevitabilidade do conteúdo de direita das políticas que leva à prática quer nas autarquias quer nos governos.
    Jerónimo de Sousa, secretário geral do PCP, e Ruben de Carvalho, candidato da CDU à presidência da Câmara Municipal de Lisboa, deram-lhe a resposta necessária, no domingo, na Ajuda. O truque de Costa é velho: para tentar captar votos de esquerda; para tentar afastar da votação na CDU homens e mulheres que, sinceramente, desejam entendimentos entre as forças à esquerda do PSD - o PS atira para cima do PCP as responsabilidades pelo facto de esses entendimentos não se concretizarem. E fá-lo fugindo à abordagem da verdadeira questão em causa, a saber: a política que o PS pratica no Governo e nas autarquias, uma política de direita que, para além disso, é abusiva e fraudulentamente praticada em nome da esquerda. É essa política de direita e não o pretenso «sectarismo do PCP», a única responsável pela inexistência de entendimentos.
    Alguém imagina os eleitos da CDU a entenderem-se com os do PS para que o partido do Governo dê continuidade, na CML, à política que faz no Governo? Repare-se, por exemplo, que, como sublinhou Ruben de Carvalho, uma das primeiras preocupações de António Costa candidato à CML, foi a de anunciar despedimentos de trabalhadores. Obviamente, a preocupação de Costa não surpreende: é isso que ele sabe fazer, é isso que tem vindo a fazer no Governo do qual saiu um dia destes e ao qual voltará um dia destes.
    E também não surpreende que os eleitos comunistas, frontal e claramente, rejeitem qualquer entendimento para uma política com essas características.
    Como sempre disse – e sempre cumpriu - o PCP não participa em entendimentos com o objectivo de formar maiorias aritméticas para fazer não se sabe que política. E como sempre disse – e sempre cumpriu – o PCP está aberto a todos os entendimentos em torno de projectos que tenham como prioridade primeira a defesa dos interesses das populações.
    É claro que António Costa, sabendo que é assim, vai continuar a fingir que não sabe, fugindo ao cerne da questão para tentar iludir segmentos importantes do eleitorado de esquerda. Por isso, é indispensável que os lisboetas – homens, mulheres e jovens de esquerda, homens, mulheres e jovens que, independentemente das suas opções políticas ou partidárias, amam a sua cidade – não se deixem iludir por essas manobras de caça ao voto e, nas próximas eleições, votem em quem sempre defendeu – e, assim, dá garantias de continuar a defender – os interesses de Lisboa e dos lisboetas.De entre os restantes candidatos há que referir os dois que, directa ou indirectamente, provêm da área do PSD: Carmona Rodrigues e Fernando Negrão. O primeiro já mostrou abundantemente o que não vale e a sua candidatura soa com autêntica sinal de alarme para a cidade: o segundo, não passa de uma promessa garantida e para cumprir de trazer a Lisboa o mais do mesmo com que os seus antecessores têm vindo a destruir a cidade e provocaram estas eleições intercalares.
    Quanto a Helena Roseta e Sá Fernandes, que têm a demagogia como principal projecto para a cidade, parecem saídos da mesma forma. Helena Roseta, apresenta-se como «independente», faz dos partidos o alvo da sua campanha e promete, para Lisboa, o paraíso. Ouvindo-a, ninguém diria que ela já foi militante de dois partidos – e que só é candidata «independente» porque o último partido a que pertenceu não a quis como candidata. Ouvindo-a falar dos seus projectos para Lisboa, ninguém diria que a sua experiência como presidente de uma câmara se traduziu numa tragédia para o concelho e respectivos munícipes.
    Sá Fernandes, candidato do BE, também se apresenta como independente – o que facilita imenso a vida eleitoral ao candidato e ao partido que o apoia: assim, independente, Sá Fernandes, dá um contributo notável para livrar o BE das responsabilidades reais que teve na situação de degradação da CML ao votar favoravelmente, na anterior Assembleia Municipal, o célebre negócio Bragaparque que, como é sabido, está na origem da realização destas eleições intercalares.
    Quando dizemos que a CDU é a alternativa não estamos a utilizar um slogan eleitoral. Estamos a dizer uma verdade confirmada por décadas de prática autárquica na cidade de Lisboa e que pode dividir-se em três períodos distintos: o primeiro, traduzido num combate constante aos desmandos de Abecassis – desmandos que, recorde-se, sempre contaram com apoios dos eleitos do PS; o segundo período, foi o da construção e aplicação de um projecto autárquico na base de um entendimento com o PS na coligação por Lisboa - na qual, recorde-se, o PCP (então com muito maior expressão eleitoral do que o PS) aceitou o encabeçamento da lista por um elemento do PS e exigiu, em contrapartida, um programa eleitoral ao serviço de Lisboa e dos lisboetas; o terceiro período, o mais recente, foi o do combate à política devastadora de Santana Lopes e de Carmona Rodrigues – política com a qual o PSD contou com apoios decisivos por parte de eleitos do PS.
    A cidade e os seus habitantes deverão exigir, no dia 15 de Julho, que o período que se segue seja o de uma prática autárquica na CML que corresponda aos seus interesses e direitos. Para isso deverão votar na CDU
    Edição Nº1750
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    quinta-feira, 14 de junho de 2007

    A Internacionalização do Mundo

    Cristovam Buarque

    Durante debate em uma Universidade, nos Estados Unidos, fui questionado sobre o que pensava da internacionalização da Amazônia. O jovem americano introduziu sua pergunta dizendo que esperava a resposta de um humanista e não de um brasileiro. Foi a primeira vez que um debatedor determinou a ótica humanista como o ponto de partida para uma resposta minha.
    De fato, como brasileiro eu simplesmente falaria contra a internacionalização da Amazônia. Por mais que nossos governos não tenham o devido cuidado com esse patrimônio, ele é nosso.
    Respondi que, como humanista, sentindo o risco da degradação ambiental que sofre a Amazônia, podia imaginar a sua internacionalização, como também de tudo o mais que tem importância para a Humanidade.
    Se a Amazônia, sob uma ótica humanista, deve ser internacionalizada, internacionalizemos também as reservas de petróleo do mundo inteiro. O petróleo é tão importante para o bem-estar da humanidade quanto a Amazônia para o nosso futuro. Apesar disso, os donos das reservas sentem-se no direito de aumentar ou diminuir a extração de petróleo e subir ou não o seu preço. Os ricos do mundo, no direito de queimar esse imenso patrimônio da Humanidade.
    Da mesma forma, o capital financeiro dos países ricos deveria ser internacionalizado. Se a Amazônia é uma reserva para todos os seres humanos, ela não pode ser queimada pela vontade de um dono, ou de um país. Queimar a Amazônia é tão grave quanto o desemprego provocado pelas decisões arbitrárias dos especuladores globais. Não podemos deixar que as reservas financeiras sirvam para queimar países inteiros na volúpia da especulação.
    Antes mesmo da Amazônia, eu gostaria de ver a internacionalização de todos os grandes museus do mundo. O Louvre não deve pertencer apenas à França. Cada museu do mundo é guardião das mais belas peças produzidas pelo gênio humano. Não se pode deixar esse patrimônio cultural, como o patrimônio natural amazônico, seja manipulado e destruído pelo gosto de um proprietário ou de um país. Não faz muito, um milionário japonês, decidiu enterrar com ele um quadro de um grande mestre. Antes disso, aquele quadro deveria ter sido internacionalizado.
    Durante o encontro em que recebi a pergunta, as Nações Unidas reuniam o Fórum do Milênio, mas alguns presidentes de países tiveram dificuldades em comparecer por constrangimentos na fronteira dos EUA. Por isso, eu disse que Nova York, como sede das Nações Unidas, deveria ser internacionalizada. Pelo menos Manhatan deveria pertencer a toda a Humanidade. Assim como Paris, Veneza, Roma, Londres, Rio de Janeiro, Brasília, Recife, cada cidade, com sua beleza especifica, sua história do mundo, deveria pertencer ao mundo inteiro.
    Se os EUA querem internacionalizar a Amazônia, pelo risco de deixá-la nas mãos de brasileiros, internacionalizemos todos os arsenais nucleares dos EUA. Até porque eles já demonstraram que são capazes de usar essas armas, provocando uma destruição milhares de vezes maior do que as lamentáveis queimadas feitas nas florestas do Brasil.
    Nos seus debates, os atuais candidatos à presidência dos EUA têm defendido a idéia de internacionalizar as reservas florestais do mundo em troca da dívida. Comecemos usando essa dívida para garantir que cada criança do mundo tenha possibilidade de ir à escola. Internacionalizemos as crianças tratando-as, todas elas, não importando o pais onde nasceram, como patrimônio que merece cuidados do mundo inteiro. Ainda mais do que merece a Amazônia. Quando os dirigentes tratarem as crianças pobres do mundo como um patrimônio da Humanidade, eles não deixarão que elas trabalhem quando deveriam estudar; que morram quando deveriam viver.
    Como humanista, aceito defender a internacionalização do mundo. Mas, enquanto o mundo me tratar como brasileiro, lutarei para que a Amazônia seja nossa. Só nossa.

    (*) Cristovam Buarque, 58, doutor em economia e professor do Departamento de Economia da UnB (Universidade de Brasília), foi governador do Distrito Federal pelo PT (1995-98). Autor, entre outras obras, de "A Segunda Abolição" (editora Paz e Terra).
    O artigo foi publicado no Globo e no Correio Brasiliense, no final de 2000. O fato em si ocorreu em Setembro de 2000 em Nova York, durante o State of The World Forum.

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    terça-feira, 12 de junho de 2007

    Agora toca ao Irão

    “Convencer as pessoas de que estas coisas se fazem para seu bem não é assim tão difícil, como se sabe desde há quase um século. (…) Não sabemos quanto se irá dedicar para convencer as opiniões públicas. Sabemos, isso sim, que se continuará a comprar ou a alugar jornalistas que, um dia, iremos saber quem são. Talvez quando já for demasiado tarde."
    José Maria Tortosa*
    Foi dito pela imprensa estadunidense, que o fantasma da guerra do Iraque paira sobre a política do governo dos Estados Unidos sobre o Irão. Em ambos os países o governa nega que esteja plaificando uma guerra, em ambos os países as evidências em que diz basear-se são falsas e em ambos os países se lança mão das melhores técnicas de “comunicação”.

    O Irão é geograficamente importante: tem 5.440 km2 e oito fronteiras continentais. Os países fronteiriços são o Iraque, o Turquemenistão, o Afeganistão, o Paquistão, a Turquia, o Azerbeijão e a Arménia. Através do mar Cáspio confina com a Rússia e o Kazaquistão e através do Golfo Pérsico com o Kowait, Arábia Saudita, Barhein, Emiratos Árabes Unidos e Omã.

    Mas o Irão não é apenas importante pela importância dos seus vizinhos, mas também pela sua posição no mercado mundial de petróleo. Segundo o CIA Factbook de 2007, o Irão é o quarto produtor de petróleo do mundo, o quinto exportador e o terceiro em reservas provadas.

    E o actual governo do Irão (como os anteriores) mostra-se pouco amistoso com Israel. E, há que dizê-lo, ainda parece menos amistoso nas mal-intencionadas traduções que são feitas dos discursos dos seus líderes.

    Acresce a tudo isto que o Irão tem uma larga história de relações complicadas com os Estados Unidos. Em 1953, a CIA dedicou, então, 1 milhão de dólares para apear Mossadeg do governo, num dos primeiros casos de intervenção directa da Agência para a “mudança” política de um país. No lugar de Mossadeg que se tinha atrevido a nacionalizar o petróleo, colocou o Xá, mais próximo dos interesses das empresas estadunidenses, que aí permaneceu até 1979, quando foi substituído por Komeini, um líder que a CIA não soube prever que ia ter o eco que teve, e não apenas no Irão (ouvi fitas magnéticas de Komeini nos bairros populares de Dakar, no Senegal, depois do Xá ter sido derrubado).

    Já antes, em 1976, na presidência de Gerald Ford, Dick Cheney, chefe do seu gabinete, Donald Rumsfeld, secretário da Defesa e Henry Kissinger, assessor de segurança nacional, o governo de Ford convenceu o Xá da necessidade de desenvolver um programa nuclear para enfrentar as suas futuras necessidades energéticas. Convenceram-no, e no desenvolvimento do programa teria comprado, pelo menos, 6.400 milhões de dólares a empresas estadunidenses como a Westinghouse e General Electric. Dada a mudança de regime, o programa não terminou mas, de qualquer modo, o caso demonstra quão infundados são os argumentos contra o programa nuclear iraniano, baseados na peregrina ideia de que não é precisa porque o Irão já tem petróleo. Além disso, o dito programa é praticamente idêntico ao que está a desenvolver o governo Lula no Brasil, potência com evidentes apetites à hegemonia regional.

    Os iranianos sabem que os Estados Unidos apoiaram o Iraque na guerra 1980-1988 e conhecem a origem do gás mostarda (arma de destruição massiva) que os iraquianos utilizaram em 1987. E sabem igualmente dos 52 reféns estadunidenses que de 1979 a 1981 estiveram detidos em Teerão, entre a presidência de Cárter e a de Reagan. Ao contrário de muitos estadunidenses, os iranianos sabem que uma parte da dita retenção foi a consequência de um acordo secreto entre o candidato Reagan e o ayatollah Komeini: “Tu nã os libertas, Carter perde as eleições, eu chego à presidência e depois fazemos contas”. O escândalo prolongou-se com chamado caso Irão-Contras (1985-1986), assunto em que o coronel Oliver North teve um papel muito importante: ilegalmente, os EUA vendiam armas ao Irão para financiar “os contra” nicaraguenses. Tudo isto levou a diversos julgamentos (o tema das armas por reféns “explodiu” em Novembro de 1986) e hoje o sr, North é comentarista da Fox News Channel, mais um novo caso em que as empresas de Rupert Murdoch (não esquecer que José Maria Aznar é um dos seus assalariados) voltam a aparecer nesta série de resenhas sobre o império.

    A opinião pública estadunidense é contrária a uma nova aventura militar na zona em que se desenrola as do Afeganistão e do Iraque. Os partidários de uma acção militar não ultrapassam os 20% nas sucessivas sondagens publicadas pelo New York Times e CBS News, onde os defensores da acção diplomática são a esmagadora maioria, sempre superior a 50%. Os que desejam a acção militar são menos, inclusive, que os que não vêem nenhuma ameaça no Irão, ainda que, e sempre de acordo com as referidas sondagens, a atitude de confrontação é muito maior entre os votantes republicanos que entre os democratas, estes mais dispostos, nas sondagens, a políticas de não ingerência.

    Mas também aqui o governo anda à procura de argumentos para o que, para muitos, é uma decisão já tomada. É certo, reconheceu a Agência France Press e documentou-o Seymour M. Hersh) que a CIA não pára de encontrar sérios indicadores da construção de armas nucleares que, em todo o caso e segundo Moahamed El Baradei, não as poderiam ter antes de três anos e, provavelmente, não antes de cinco. Nada disso importa.

    Como este argumento já está muito gasto e a sua aplicação no Iraque não foi particularmente brilhante, a alternativa foi a de tentar responsabilizar o governo do Irão pelos apoios que os xiitas iraquianos estariam a receber. Trata-se de fazer crer que determinadas mortes de cidadãos estadunidenses (soldados, mercenários ou civis que estão no Iraque) estão relacionadas com actividades iranianas. Se este tipo de argumento não funcionar (e de momento não está a funcionar, já que as dúvidas são crescentes), há quem suspeito que há uma possibilidade de surgir um atentado nos Estados Unidos, que poderia ser atribuído ao Irão. Dick Cheney insinuou-o e há que reconhecer que estes membros do velho “Projecto para um Novo Século Americano” que inclui Donald Rumsfeld, Jeb Bush, Paul Wolfwitz, Richard Perle e Douglas Feith, entre outros) costumam ser muito directos nas suas observações. Existe também a possibilidade de desestabilizar (através de “operações encobertas”) o governo do Irão para, assim, justificarem a intervenção em prol da ordem, da paz e da estabilidade. A decisão, pois, parece estar tomada. Agora trata-se de procurar os argumentos.

    Em contrapartida, não está claro quem levaria a cabo o ataque. São conhecidos os jogos de guerra anglo-saxónicos e “os desvalorizados bombardeamentos” simulados e detectados desde o Verão de 1975 e, recentemente (finais de Maio de 2007) a chegada ao Golfo Pérsico em frente da costa do Irão, de nove barcos de guerra estadunidenses, com 17.000 efectivos a bordo, num desafio que só tem precedentes no realizado em 2003, quando começou a guerra do Iraque.

    Mas não está excluído que o ataque seja perpetrado por Israel, que também fez exercícios e voos até Gibraltar para provar a sua capacidade. De acordo com o Há’aretz, jornal de Jerusalém, Bush “entenderia que Israel decidisse atacar o Irão”. Desta forma, Israel repetiria o que fez contra o Iraque, quando bombardeou Osirak em 1981.

    A dúvida maior, é quando. A Agência France Press (22 de Novembro de 2006) supunha que iria ser no Verão de 2007 e o número especial do Newsweek dedicado ao tema (19 de Fevereiro de 2007) parecia ir na mesma direcção. No entanto, Simon Tisdall (The Guardian, 16 de Maio de 2007) falava na possibilidade do ataque ter sido suspenso por um ano. A ver vamos.

    É que, de acordo com James Petras (31 de Maio de 2006), as opiniões nos Estados Unidos estavam e continuam divididas. Dizia que “existe uma coligação que, liderada pelas principais organizações pró Israel, os militaristas civis do Pentágono, a maioria dos órgãos de comunicação e uma minoria da opinião pública, que apoia um ataque militar. Opõem-se a esta opção a grande percentagem de altos oficiais reformados, os líderes da indústria petrolífera, a maior parte das organizações cristãs e muçulmanas e uma maioria do povo estadunidense”, como já foi dito.

    Os objectivos parecem claros. Israel identificou três como principais:

    Natanz, onde se instalaram milhares de centrifugadoras para enriquecer urânio, uma instalação para a conversão de urânio perto de Isfaha e um reactor de água pesada em Arak. As autoridades israelitas acreditam que a destruição destes três pontos atrasaria o programa nuclear iraniano indefinidamente e evitaria viverem sob o medo de um “segundo holocausto”, como informava o The Sunday Times de 7 de Janeiro de 2007.

    Porquê? Parece que, apesar da história e do petróleo, o argumento central é a percepção que Israel tem do Irão, como uma ameaça à sua própria existência. Israel pode ser uma potência nuclear, mas a presença de outra potência na zona alteraria a capacidade de ameaça que agora tem o governo, seja ele mais ou menos sionista. O medo de um “segundo holocausto” é compreensível, por mais que as referências à shoa tenham sempre uma componente suspeita de manipulação interessada da má consciência europeia.

    E não podemos esquecer que entre a hipótese de que Israel é o gendarme dos Estados Unidos na zona e a hipótese de os Estados Unidos fazerem a política mais conveniente para o Estado de Israel, é a segunda a que tem mais argumentos a seu favor. Eleitoralmente há tantos judeus ou originários de judeus nos Estados Unidos como em Israel. Politicamente, a AIPAC, o grupo de pressão (lobby) israelita é, fora de qualquer discussão, o mais importante entre tdos os que “trabalham” as decisões de Washington. Pessoalmente, e o dado foi aflorado precisamente no Há’aretz, uma parte importante dos chamados “neoconservadores” hoje no governo de Bush são não só judeus, mas também muitos dos que trabalharam directamente na imprensa israelita (no Jerusalém Post, por exemplo) ou fizeram relatórios para governos e partidos israelitas, particularmente para o Likud.

    A realizar-se, este ataque será acompanhado, como o do Iraque, por uma importante campanha na “comunicação” (isto é de propaganda; quer dizer de mentiras deliberadas), reeditando um novo Pearl Harbour, para convencer sobre a necessidade dessa guerra. Então, saberemos da maldade intrínseca do regime de Ahmadineyad (a que então chamaremos dos ayatolas), como conheceremos o seu fundamentalismo e os seus propósitos agressivos contra todo o mundo, e seremos também informados que, se queremos petróleo barato, não há outro remédio que pagar o preço de umas quantas vidas.

    Mas o efeito será o contrário: o preço do petróleo aumentará (com o que as empresas que o acumularam quando preço caía ao vendê-lo a novo preço terão lucros interessantes), o reformismo político iraniano sofrerá um sério revés (se, apesar das suas eleições parecerem mais limpas que as dos Estados Unidos, quisessem a “democratização” seria o reformismo político iraniano que seria de apoiar), o regime tornar-se-á verdadeiramente fundamentalista e, as reacções no mundo contra esta nova aventura imperial, manifestar-se-ão de imediato, acentuando a mágoa muçulmana e árabe. Não esqueçamos que o Irão é de maioria muçulmana, mas de minoria árabe.

    Por sorte, sempre temos meios de comunicação (com a Fox á cabeça) que nos explique que esses pequenos males são compensados por “bens imensos” (os que prometia em Madrid Jeb Bush ao presidente da “república” espanhola pouco antes da invasão do Iraque) e, em todo o caso, serão menores que os males que acarretaria uma estratégia de “apaziguamento” como a que pretendiam algumas potências europeias, Neville Chamberlain à frente, face a Hitler. Porque a comparação com Hitler se vai utilizar uma vez mais, a comparação com Goebbels torna-se também necessária: convencer as pessoas de que estas coisas se fazem para seu bem não é assim tão difícil, como se sabe desde há quase um século. Para 2007, o governo dos Estados Unidos pretendia dedicar um mínimo de 75 milhões de dólares à “diplomacia pública” (propaganda dirigida às populações de outros países) no Irão. Não sabemos quanto se irá dedicar para convencer as restantes opiniões públicas. Sabemos, isso sim, que se continuará a comprar ou a alugar jornalistas que, um dia, iremos saber quem são. Talvez quando já for demasiado tarde.

    * Catedrático de Sociología,no Instituto Universitario de Desarrollo Social y Paz de la Universidad de Alicante.

    Este artigo foi publicado em www.rebelión.org do dia 26 de Maio de 2007
    Este artigo foi publicado em http://www.odiario.info

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    A classe media, os movimentos sociais e a esquerda

    A classe media, os movimentos sociais e a esquerda
    por James Petras*



    O comportamento social e político da classe média é determinado pela sua posição e interesses de classe e o contexto político-económico com o qual se confronta. No contexto de um regime de direita com economia em expansão, créditos baratos e importações de bens de consumo a baixos preços, a classe média é atraída para a direita. No contexto de um regime de direita em profunda crise económica, a classe média pode ser parte de uma vasta frente popular, procurando recuperar sua a propriedade, as poupanças e o emprego perdidos. Quando há um governo popular anti-ditatorial e anti-imperialista, a classe média apoia reformas democráticas mas opõe-se a qualquer radicalização que torne as suas condições iguais às da classe trabalhadora.

    Três exemplos, Brasil, Argentina e Bolívia, ilustram a mudança de orientação bem como as divisões internas da classe média. No Brasil, a classe média ascendente, composta por funcionários, profissionais, advogados trabalhistas e burocratas sindicais assumiram o comando do Partido do Trabalhadores (PT) liderado por Lula da Silva. Com 75% dos delegados, eles apoiaram uma aliança eleitoral com o Partido Liberal do big business e com o sector financeiro. Uma vez no poder, eles moveram-se das posições social-democratas para as dos políticos neoliberais. Os movimentos sociais, incluindo o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o Movimento dos Pobres Urbanos Sem Casa (MSC), apoiaram a eleição de Lula na base das promessas pré-eleitorais, deixando de aplicar uma análise de classe às mudanças na política, na liderança e no programa.

    O resultado foi que os movimentos sociais desperdiçaram cinco anos a argumentar que o regime Lula era 'território em disputa' e que poderia ser empurrado para a esquerda. Em consequência, o MST perdeu terreno político, ficou organizativamente isolado e os seus militantes desorientados durante aproximadamente cinco anos. Durante esse período, Lula cortou as pensões dos trabalhadores sindicalizados do sector público (professores, empregados dos correios, trabalhadores da saúde, funcionários, etc) em 30%, aumentou a idade de aposentadoria e privatizou fundos de pensão públicos. Por isso os sindicatos de funcionários públicos romperam com o governo e com a confederação sindical pró-governo (CUT) e aderiu a outros sindicatos independentes para constituir uma nova confederação, a CONLUTA, que inclui estudantes, ecologistas e outros grupos. Em 2007, numa assembleia nacional, a CONLUTA recebeu o apoio do MST e de sectores da CUT para a organização de uma greve geral no fim de Maio … As ligações de movimentos sociais às políticas eleitorais de partidos social-democratas, que estão a rumar para políticas neoliberais, é um desastre político. A falta de um programa político independente com base na classe e de uma liderança orientada para o poder do Estado entre os movimentos sociais forçou-os a subordinarem-se ao antigo Partido dos Trabalhadores social-democrata, o qual estava ligado ao imperialismo, às finanças e ao capital agro-mineral. Por outro lado, o sindicato dos funcionários públicos e o sector político da classe média foram forçados a romper com Lula e a procurar aliados na esquerda radical, incluindo movimentos sociais, e a rejeitar laços com a grande e pequena burguesia do sector privado.

    Na Argentina, a classe média, especialmente a pequena burguesia do sector privado, apoiou o regime neoliberal de Menem na década de 1990. O seu apoio baseou-se no crédito barato (baixas taxas de juro), importações baratas de bens de consumo, uma economia dolarizada e uma economia em expansão baseada em empréstimos externos. Com as crises económicas (1999-2002) e o colapso da economia (Dezembro 2001-Dezembro 2002), a classe média viu as suas contas bancárias congeladas, perdeu os seus empregos, os negócios entraram em bancarrota e a pobreza atingiu mais de 50% da população. Em consequência, a classe média 'radicalizou-se': ela foi às ruas numa rebelião em massa a fim de protestar em frente aos bancos, ao Congresso e ao Palácio Presidencial. Por todas as grandes cidades, nos bairros da classe formaram-se assembleias populares que confraternizaram com organizações de trabalhadores desempregados (piqueteros) no bloqueamento das principais auto-estradas e ruas. Esta rebelião espontânea da classe média adoptou o slogan "Que se vayan todos!", o que reflecte a rejeição do status quo neoliberal mas também qualquer solução radical. A esquerda do sindicato de funcionários públicos (CTA) o sindicato direitista do sector privado (CGT) pouco ajudaram na liderança — no melhor dos casos membros individuais desempenharam um papel nos novos movimentos sociais com base nas "villas miséria" — os vastos bairros da lata urbanos. A esquerda e os partidos marxistas intervieram para fragmentar o movimento de massa de trabalhadores desempregados ao super-ideologizar e dissolver as assembleias de moradores da classe média. Em meados de 2003 a classe média mudou de política eleitoral e votou por Kirchner que fez campanha como social-democrata de 'centro-esquerda'. A partir de 2003 os preços das commodities mundiais ascenderam significativamente, a Argentina adiou e posteriormente reduziu seus pagamentos da dívida e Kirchner estabilizou a economia, descongelou as contas bancárias da classe média a qual então se virou em direcção ao centro.

    Enquanto isso Kirchner aproveitou-se do fragmentado movimento de trabalhadores desempregados e cooptou muitos líderes, proporcionou subsídios mensais de US$ 50 a cada família e começou um processo de negociações selectivas e de exclusão seguida de repressão, isolando os radicais da esquerda reformista. Em 2007, as principais lutas de classe envolvem os empregados do sector público ou a classe média e o regime Kirchner quanto a salários. O movimento da ocupação de fábricas foi cooptado dentro do Estado. Os movimentos de trabalhadores desempregados ainda existem mas com força muito mais reduzida. A classe média privada, tendo recuperado e desfrutado um crescimento elevado, está a mover-se do centro-esquerda para o centro-direita.

    A Argentina ilustra como a política da classe média pode mudar dramaticamente da conformidade à rebelião, mas na falta de qualquer direcção política retrocede para a direita. Com a estabilização, a classe média privada separa-se dos funcionários públicos, com os primeiros a apoiarem neoliberais e os últimos a social-democracia.

    O governo do MAS (Movimento para o Socialismo) na Bolívia tem uma base de massa eleitoral constituída por pobres urbanos e rurais-urbanos, mas os seus ministros são todos profissionais burgueses, tecnocratas e juristas com uns poucos líderes de movimentos cooptados. Evo Morales combina demagogia política para as massas, como 'nacionalização do petróleo e do gás' e 'reforma agrária' com práticas liberais tais como assinar acordos de joint venture com todas as grandes companhias internacionais de petróleo e gás e excluir da expropriação para a reforma agrária grandes plantações 'produtivas' possuídas pela oligarquia. Enquanto isso, os pequeno-burgueses privados que inicialmente apoiaram Evo Morales para pacificar a rebelião dos índios e trabalhadores, subsequentemente viram para a direita. Além disso, como Morales apoia políticas de estabilização macroeconómica austeras tipo FMI, ele fez com que os grandes sindicatos de funcionários públicos (nomeadamente professores e trabalhadores da saúde) fossem à greve.

    As consequências para os movimentos, como no Brasil e na Argentina, incluem a fragmentação, divisões e o retorno da classe média privada para o centro-direita. Os movimentos sociais são desmobilizados e há descontentamento crescente entre a classe média do sector público acerca de aumentos salariais que mal excedem a elevação do custo de vida, apesar do grande aumento nas receitas do governo devido ao alto preços das exportações minerais.

    Os novos programas de centro-esquerda (CE) de Lula, Kirchner e Morales na verdade são a nova face da direita neoliberal. Os regimes de CE seguiram as mesmas políticas macroeconómicas, recusaram-se a reverter as privatizações ilegais dos regimes anteriores, mantiveram as brutais desigualdades de classes e enfraqueceram os movimentos sociais. Os regimes CE foram estabilizados pelo boom nos preços das commodities [ver gráficos] e por excedentes orçamentais e comerciais, que lhes permitiram proporcionar programas mínimos de alívio da pobreza. O seu principal êxito foi desmobilizar a esquerda, restaurar a hegemonia capitalista e um grau de autonomia relativa em relação aos EUA através da diversificação com mercados da Ásia.

    O principal problema dos movimentos sociais foi o fracasso em desenvolver uma liderança política e um programa para o poder do Estado e, portanto, depender dos políticos eleitorais da classe média de profissionais com mobilidade em ascensão. Tão logo os movimentos subordinaram políticas extra-parlamentares aos partidos eleitorais, eles foram capturados em alianças eleitorais entre os líderes da classe média e os grandes capitalistas.

    A centro-esquerda, aproveitando condições económicas internacionais favoráveis (altos preços das commodities, alta liquidez), pode estabilizar a economia, baixar o desemprego e reduzir a pobreza, mas não pode resolver os problemas básicos do desenvolvimento desigual, do sub-emprego, da concentração de riqueza e poder e da exploração e desigualdades.

    A relação da esquerda com a classe média tem uma abordagem de direita e de esquerda. A abordagem de direita envolve o abandono das exigências anti-capitalistas e anti-imperialistas a fim de ganhar o apoio do sector privado da classe média. Isto significa sacrificar mudanças estruturais, favoráveis à classe trabalhadora, camponeses e desempregados, em prol de vagas promessas de emprego, estabilidade, protecção de negócios locais e crescimento. A abordagem de esquerda destina-se a apoiar o sector público da classe média em oposição a medidas neoliberais como privatizações, e apoiando a renacionalização de indústrias básicas, aumentos de salários, pensões e garantias de segurança social, saúde público e educação superior. O desafio chave para a esquerda é combinar a oposição da classe média do sector público ao neoliberalismo com o anti-capitalismo e o anti-imperialismo, apoiado pelos sectores militantes dos trabalhadores e do campesinato.




    24/Maio/2007




    * Sociólogo. O seu ultimo livro é The Power of Israel in the United States
    (encomendas através http://resistir.info permitem que resistir.info receba uma pequena comissão).

    O original encontra-se em
    http://www.axisoflogic.com/artman/publish/article_24647.shtml
    Este artigo encontra-se em http://resistir.info


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    quarta-feira, 6 de junho de 2007

    “O que fez a diferença foi a CDU estar ou não no poder da CML”

    O candidato da CDU à Câmara Municipal de Lisboa, Ruben de Carvalho, em entrevista ao SEMANÁRIO, considera ser indispensável uma reorganização e uma reestruturação da autarquia, não esquecendo a regularização da actual situação financeira. Por outro lado, mostra-se contra um eventual encerramento do aeroporto da Portela e tem uma posição muito reservada quanto à implementação de portagens nas principais vias de entrada na capital.

    Por que é que a CDU é a alternativa para Lisboa?
    Quase que poderia pôr o problema ao contrário e responder não tanto como uma pergunta, mas com uma sugestão, de que se olhasse para a realidade de Lisboa nos últimos 30 anos e que se visse quando é que houve uma política diferente, quando é que a cidade resolveu o problema das barracas, quando é que Lisboa desenvolveu os equipamentos desportivos, quando é que Lisboa fez um PDM (Plano Director Municipal), quando é que se desenvolveu uma política de descentralização da câmara para as freguesias com uma actividade directa junto das populações, quando é que isso aconteceu? Aconteceu quando houve uma coligação PS/ PCP e é verdade que, com a gestão de Santana Lopes e Carmona Rodrigues, aconteceu exactamente o contrário. A verdade é que, quer durante a gestão Abecasis, quer na gestão de Santana Lopes e de Carmona Rodrigues, em muitas medidas, é o mesmo PS que apoiou medidas de política de direita. O que fez sempre a diferença em Lisboa foi a CDU e o PCP estarem ou não, no poder da câmara.

    Pode enunciar-me as principais prioridades/projectos da sua candidatura à CML?
    Temos sublinhado um conjunto de aspectos, mas em todo o caso chamo a atenção para o seguinte. Quando se colocou o problema das eleições intercalares, chamamos a atenção de que seriam uma saída para a crise política, a que a política de direita tinha conduzido a câmara, mas não era seguramente a realização de eleições que iriam dar lugar a uma vereação com uma duração de dois anos e que iriam criar soluções para os problemas. Portanto, quando olhamos para os problemas da cidade, não olhamos a um horizonte de dois anos, mas sim um horizonte mais largo que é único e que torna possível a solução dos problemas que a cidade tem. Entendemos que é indispensável regularizar a situação financeira e gostaria de sublinhar esta situação, porque a esse respeito tem havido bastante confusão. Entendemos que é absolutamente indispensável que nessa regularização financeira, haja dois aspectos prioritários: por um lado, o respeito pelos trabalhadores, pela sua remuneração e pelo seu trabalho, e, por outro, o problema da dívida da câmara aos fornecedores. Dívidas que se referem a pequenos e médios fornecedores, que se ressentem particularmente destes atrasos no pagamento. A segunda questão fundamental é a de reorganizar e reestruturar a câmara no quadro não apenas de uma maior eficiência, mas também no quadro de repor e motivar de novo as hierarquias, as chefias, e os trabalhadores da câmara. Porque se a CML não está completamente paralisada, aos seus trabalhadores o deve, pois a política que foi seguida tê-la-ia paralisado por completo, sendo a grande riqueza da câmara os seus trabalhadores. A terceira questão é a de um inventário rigoroso ao seu património, que permita fazer uma gestão rigorosa. Contudo, devo acrescentar mais dois aspectos também prioritários: a reabilitação urbana, em termos de intervenção urbana na cidade, e a prioridade também ao espaço público e à sua qualidade. Do ponto de vista programático, entendemos que é urgente concluir a revisão do PDM e pôr a funcionar em Lisboa um novo Plano Director Municipal.

    O que pensa sobre a actual crise financeira da CML e que medidas tomaria para inverter a situação?
    Quando se analisa uma situação económica há três planos diferentes, seja em relação a uma empresa ou a uma instituição. Há um plano económico, há um plano financeiro e há um plano de tesouraria. Uma empresa pode estar com uma situação financeira óptima e com uma situação de tesouraria péssima, e a inversa também é verdadeira. O que se passa com a CML, é que a mesma tem uma situação de tesouraria muito grave, tem uma situação financeira grave, mas não tem uma situação económica de colapso ou de falência. Esta última situação só se daria na altura em que o passivo da câmara fosse superior ao activo e não o é. O conjunto da dívida da câmara a curto, médio e longo prazo, não excede o seu activo, sendo embora certo, que é absolutamente necessário um inventário rigoroso do património, que não existe. Porque só com um inventário rigoroso é possível fazer essa gestão, pois sabe-se que as coisas existem, mas não se sabe em que estado estão, nem quanto é que valem. Em segundo lugar, há que ter rigor e atenção relativamente às despesas e às receitas. Quando numa estrutura com a vastidão que a CML tem, se altera, estraga e perturba o funcionamento da estrutura, tudo se perturba no campo financeiro, seja no campo das receitas ou das despesas. Ora, os últimos seis anos de gestão da direita foram um perfeito caos do ponto de vista da gestão financeira. Estas duas medidas têm de ser tomadas simultaneamente com a estrutura da câmara, com os seus trabalhadores, no sentido de melhorar as receitas, a cobrança de taxas e ver bem as despesas, no sentido de limitá-las. Mas, não com cortes absurdos, mas sim ver onde se está a gastar dinheiro e onde é ou não necessário. Terceira questão, o dr. António Costa tem um cartaz a dizer que é preciso rigor, o que acho curioso porque eu não sei qual é que é a alternativa. Obviamente que é preciso rigor e qualquer pessoa dirá o mesmo, mas, logo a seguir, vem dizer que a câmara está numa situação tal que necessita de um apoio financeiro, em que os contornos ainda não sei muito bem o que sugere, por parte do Governo. Isto é duplamente inconcebível, porque António Costa era o ministro da Administração Interna até há um mês atrás, exactamente na altura em que este Governo, por uma medida arbitrária e em nosso entender ilegal, privou a câmara de uma quantia que, nos termos da lei do Orçamento do Estado, tem direito relativamente á cobrança do IRS, no valor de 35 milhões de euros. Portanto não é necessário que o Estado faça nada em relação à CML, que não seja cumprir as suas obrigações.

    Que consequências trará, para o município de Lisboa, a nova Lei das finanças locais?
    Subscrevemos a posição da Associação Nacional de Municípios de reserva e crítica em relação à lei das finanças locais. Penso que a Lei das Finanças Locais tem que ser analisada pelos portugueses em duas ópticas. Eu e o meu partido não subscrevemos tudo o que tem acontecido no poder local de norte a sul do País e somos muito críticos em relação a dinheiros mal gastos, a obras mal concebidas, entre outras situações. Mas o que também não esquecemos é que passos enormes que foram dados para o bem-estar das populações e no desenvolvimento do País, só foram possíveis graças ao poder local. Portugal não seria hoje o País que é, se em cada concelho e em cada freguesia, não tivesse havido um esforço dos eleitos locais e dos autarcas. Aqui e ali foram cometidos alguns erros e terá havido práticas menos adequadas, mas para isso existem os tribunais por um lado e o julgamento dos eleitores por outro. Em meu entender, estamos a assistir por parte do actual Governo a uma enorme campanha do ponto de vista ideológico e do ponto de vista político, que é arranjar dois grandes culpados para a situação económica do país: os funcionários públicos e o poder local.

    O que acha sobre o actual estado das empresas municipais?
    No PCP não temos uma posição de princípio contrário às empresas municipais. De resto, nós próprios, num pelouro que foi gerido pelo PCP na coligação, constituímos uma empresa municipal. O que para nós é absolutamente essencial e é um pressuposto de ordem política, é a primazia do interesse público sobre o interesse privado. Se uma empresa municipal protege e defende melhor o interesse público do que um serviço municipal, admitimos perfeitamente esta hipótese, mas com responsabilidade, porque há aqui um compromisso a assumir. Ora a situação que temos presentemente, é que temos assistido a um alargamento do parque municipal de empresas com direito privado, com alguns aspectos particularmente graves mas onde as situações não são todas iguais. Consideramos que há empresas que são pura e simplesmente para eliminar, porque não há nada que justifique a sua existência. As três sociedades de reabilitação urbana (SRU) não se justificam e não há nenhuma razão para que elas existam.. Assim as SRU não têm razão de existir e são uma despesa suplementar. Depois há empresas que necessitam de uma profunda reestruturação e a primeira sem duvida é a EPUL. Defendemos a extinção das empresas participadas da EPUL, a Imohifen e a AGF e, por outro lado, o repor a EPUL do ponto de vista da sua administração e acção à luz do critério pelo qual ela foi criada.

    No seu entender, que implicações terá para a cidade um eventual encerramento do Aeroporto de Lisboa, com a possível construção do aeroporto na OTA?
    Penso que deveremos ter sido das primeiras forças políticas que se manifestaram frontalmente contrárias ao encerramento do aeroporto da Portela. Há aqui dois problemas que têm que ser considerados e há alguma mistificação na constante associação de duas coisas. Não ponho em causa que, mais cedo ou mais tarde, se possa tornar necessária a construção de um segundo aeroporto para Lisboa. Primeiro, há uma coisa sobre a qual não tenho dúvidas nenhumas, é que o aeroporto da Portela está longe de estar saturado, ou seja, impraticável. Segundo, que a Portela é uma mais-valia para a cidade de Lisboa, nos mais variados pontos de vista, a começar naturalmente pelo ponto de vista do turismo e pelas características que isso tem. Portanto, ao fazer--se outro aeroporto, há que discutir esse problema. No entanto, encerrar o aeroporto da Portela agora acho que nem sequer é discutível, pois seria um crime contra Lisboa.

    Concorda com a implementação de portagens nas principais vias de entrada na cidade de Lisboa?
    Do ponto de vista colectivo, enquanto CDU e enquanto PCP, temos uma posição muito reservada em relação a essa situação. Isto quer dizer que em princípio somos contra, porque somos contra a criação de taxas e nomeadamente taxas para a localização do espaço público. No fundo, essas taxas nunca são cegas, sendo apenas para evitar que quem tem menos recursos aceda à cidade, porque quem tem mais recursos, não é por causa de uma taxa que deixará de vir à cidade. Do ponto de vista social, não é uma medida que esteja de acordo com a nossa visão da cidade. Entretanto, é uma verdade que entram por dia cerca de 400 mil carros em Lisboa e que o problema do transporte individual gera problemas gravíssimos na cidade. Porém, a questão das taxas, de que há exemplo noutras capitais europeias, terá de ser estudada seriamente. Mas o problema é este, é que para obviar o problema com que se pretende dar resposta com as taxas, há outras medidas, como a criação da Autoridade Metropolitana de Transportes. Porque o problema da circulação e da mobilidade em Lisboa, não se resolve no estrito limite do concelho de Lisboa. Se entram 400 mil carros, não é em Lisboa que conseguiremos resolver o problema, mas sim de onde eles vêm. E portanto isso requer uma coordenação de trabalho com os concelhos limítrofes, com o poder central que tutela os transportes pesados, como sendo o metropolitano e como são os comboios. Ao inverter o actual quadro, melhora-se também a situação em Lisboa do funcionamento dos transportes públicos.

    O que será para a sua candidatura um resultado positivo ou negativo, nestas eleições intercalares?
    O que considero globalmente positivo para a minha candidatura nestas eleições intercalares, é que se ponha termo à política de direita em Lisboa e isto para mim e para a força que represento é fundamental. Do ponto de vista de um bom resultado para nós, o bom resultado político será este. O nosso mau resultado será nós podermos dar para essa medida, o melhor contributo possível, sendo certo em nosso entender e já demonstramos, que somos quem mais consistentemente se tem oposto ao que está mal e quem mais consequentemente tem contribuído para o que está bem.

    Podemos encarar mais esta sua candidatura à frente dos destinos da cidade de Lisboa, como sendo um sinal de estabilidade por parte da CDU ou antes uma falta de alternativa?
    Não tenho grandes dúvidas em dizer que é antes de mais nada um sintoma de estabilidade. Se olharmos para o PCP e para o conjunto da acção do PCP, verificamos que não faltam quadros técnicos com conhecimento e com capacidade e até a própria realidade atesta isso mesmo.

    Como reage à afirmação de António Costa, de que a responsabilidade de uma ausência de coligação à esquerda, se deve entre outros também à CDU?
    Já várias vezes me foram feitas perguntas acerca desta questão e por exemplo foi-me perguntado se o dr. António Costa me telefonou. Não me telefonou e não sei se o Dr. António Costa disse alguém que me telefonou, mas isso é um problema dele. Pela parte que me toca não recebi nenhum telefonema. Relativamente à questão dessa responsabilidade, penso que da parte do dr. António Costa não é uma posição muito sensata, porque o dr. António Costa sabe perfeitamente que em outras circunstâncias a CDU se manifestou favorável a entendimentos à esquerda. Quando a coligação PS/ PCP perdeu as eleições para o dr. Pedro Santana Lopes há seis anos, propusemos ao PS manter a coligação e portanto conduzir uma oposição em coligação consequente e forte. No entanto, foi o PS que não quis e uns meses mais tarde estava a votar com o Dr. Pedro Santana Lopes, negócios como a permuta do Parque Mayer com a Feira Popular e esta é a realidade. Quatro anos depois colocam-se eleições e nós escrevemos ao PS, a propor uma negociação para refazer a coligação. O PS colocou-nos condições que à partida, qualquer pessoa compreenderia que eram as condições para não fazer uma coligação. Nas actuais circunstâncias, quando o PS que, entretanto, está no Governo, conduz contra as autarquias locais, a politica de hostilidade e que no caso de Lisboa até se manifesta, como já fiz referência, a retirar verbas significativas que deveriam ser entregues.
    Quando o Governo de Sócrates trata a CML como se ela não existisse, em situações como a alienação do património do Estado e em situações como a administração do Porto de Lisboa e em empresas que tutela como a carris ou o metropolitano ou a CP, quando tudo isto se passa e globalmente o PS conduz no país todo, uma política a qual, sem qualquer tipo de reserva o PCP se opõe, faz sentido falar em coligações? Não há dois "PS" que eu saiba, que eu saiba só há um. Então o PS que eu conheço e que está no Poder, face ao país segue esta política, que face às autarquias segue a politica que segue, faz sentido uma coligação? É o PCP o responsável pela política que o PS está a seguir? Não é de certeza. Agora, atenção, pois significa isto que nós entendemos que nesta, como em outras circunstâncias, não há nenhuma hipótese de confluências no futuro? A nossa política em termos de poder local sempre tem sido essa, com todas as forças políticas.

    Admite algum entendimento pós-eleitoral?
    Não um entendimento pós-eleitoral com um carácter que, por exemplo, envolva distribuições de lugares, porque não estamos aqui a discutir esta questão, nem a distribuição de pelouros. O nosso problema não é esse, nós estamos a discutir política e estamos a discutir actos e acções de intervenção política. Sempre que estivermos de acordo com ela, o nosso voto lá estará, sempre que nós estivermos em desacordo com ela, o nosso voto lá estará sempre contra.

    Acha que os resultados destas eleições poderão ou não ter uma visão a nível nacional?
    Inevitavelmente têm sempre, pois estamos a falar da capital do país e é evidente que haverá conclusões a retirar destas eleições. Mas estas eleições para a CML até acontecem em condições muito particulares, porque são eleições intercalares, provocadas por uma crise política gerada pela acção de direita no poder, apoiada frequentemente pelo Partido Socialista e disso naturalmente haverá a tirar conclusões. Generalizar muito mais do que isto, só com a prudência, o cuidado e o equilíbrio, que uma política responsável implica.

    Que pensa sobre a data marcada para a realização destas eleições intercalares?
    Quando o problema se colocou, nós no quadro legal e existente manifestamo-nos por eleições ou no dia 1 ou no dia 8 de Julho e isto com dois tipos de preocupações. A preocupação de abreviar o mais possível uma situação de instabilidade da câmara, com comissões administrativas, paralisações de serviços, entre outras coisas e por outro lado, fazer cair as eleições o menos possível já no mês de Julho, para evitar o peso de uma previsível abstenção por causa do período de férias. Houve protestos em relação a isto e há uma decisão do Tribunal Constitucional. Nós não contestamos a decisão do TC, pois se o TC entende que a constituição determina a isso e ela obriga-nos a todos, só que tal facto levanta os dois problemas que referi anteriormente.

    Luís Nogueira
    2007-06-06 - Semanário

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    segunda-feira, 4 de junho de 2007

    Empresas privadas concentram quase 80% das estações TV na Venezuela

    Por esta sintética e bem informada resenha da concentração dos meios de comunicação social e audiovisual no poder económico pode constatar-se como, ao contrário do que manipuladora e concentrada comunicação social de referência (internacional e nacional) pretende fazer crer, a não renovação da licença à Rádio Caracas Televisión (RCTV) foi uma medida em defesa do direito do povo venezuelano à informação.
    Stella Callón

    A agitação internacional dos meios de comunicação massiva contra a decisão do presidente Hugo Chávez de não renovar a concessão outorgada há mais de 50 anos à Radio Caracas Televissión (RCTV), tenta evitar “que mude a grave desigualdade no uso do espectro radioeléctrico na Venezuela, apesar de ser considerado um bem de domínio público no país”, sublinharam funcionários venezuelanos a este jornal [Transfondo].

    Também advertiram sobre o carácter desestabilizador da campanha “tergiversando sobre a natureza constitucional da decisão”, como disse o o ministro do Poder Popular para a Comunicação e Informação (MINCI), William Lara.

    Disse ainda que se “discute uma decisão soberana e se tenta questionar a administração do Estado em áreas estratégicas, tal e como estabelece o texto constitucional na manutenção da nossa soberania nacional”.

    De acordo com os dados da entidade reguladora da Comissão Nacional de Telecomunicações (CONATEL) do passado dia 27 de Janeiro, 78% das estações de televisão em VHF são utilizadas pelo sector privado, e apenas 22% pelo sector público; e na banda UHF, 82% são operadas por privados; 7% pelo sector público e 11% por operadores de serviços comunitários.

    O poder mediático

    No Livro Branco sobre a RCTV publicado pelo MINCI, um grupo d investigadores demonstram a enorme concentração em mãos privadas dos meios radioeléctricos da Venezuela, como se viu no chamado “golpe mediático” (de Estado) em 11 de Abril de 2002.

    Gustavo Hernandez, citado nesse livro, adverte que não se pode chamar “misto” ao sistema de radiodifusão que impera no país, quando há uma “coexistência na desigualdade” entre o regime privado e do público.

    Isto sucede desde que os governos de Eleazar López Contreras (1936-1941) e Marcos Pérez Jimenes (1946-1958) outorgaram 27 licenças de radiodifusão sonora e quatro de televisão a sectores privados.

    Os verdadeiros donos do espectro radioeléctrico venezuelano são a RCTV e Venevisión que concentram 85% do investimento publicitário em meios de comunicação do país, têm 66% do poder de transmissão, dominam as redes transmissoras e de difusão do sinal e controlam 80% da produção e elaboração de mensagens e conteúdos que se difundem na Venezuela” sublinha Hernández.

    A investigação revela a estructura interna dos principias grupos de poder mediático encabeçados pela Organização Cisneros (ODC) Venevisión “uma holding com tendência globalizante e investimentos em diversas áreas económicas”. Só a indústria de espectáculos trouxe-lhe lucos de cinco mil milhões de dólares

    A ODC “tem uma importante participação na Chilevisão (Chile), Caracol (Colômbia) N Caribe (Caribean Communication Network) para além da Venevisión, e é o maior accionista da cadeia estadunidense Univisión e do sinal da Galavisión para o público de língua espanhola dos Estados Unidos.

    E também na Aol Latinoamérica que, conjuntamente com On Line, é um dos principais servidores de Internet, controlando importantes portais. Além disso é dono de 80 empresas a nível nacional e internacional em diversos sectores, todos estratégicos.

    O grupo é formado por Gustavo, Ricardo e Marion Cisneros e a maioria das suas empresas “não possui accionistas directos, mas através de participações cruzadas amplia enormemente o espectro das companhias que maneja” que vão desde produtoras discográficas, Pepsi Cola, cosméticos, Pizza Hut, e uma enorme quantidade de outras empresas nas quais possui mais de 50% das acções.

    O grupo Cisneros controla ainda 47,5% do canal de sinal aberto Vale através da sua interligação com capitais estrangeiros, participando assim noutras empresas como a FM Center Concesionaria, cuja direcção faz parte da ODC.

    Em segundo lugar está a 1BC.RCTV que – diz o relatório – foi conhecido como grupo Phelps nos anos 20. Em 1929 constituía-se como holding empresarial Sindicato Phelps. Em 1930 derivou para as comunicações, apoiado na RCA – produtora de aparelhos radiofónicos que Phelps distribuía na Venezuela – fundando a 1Broadcasting Caracas (1BC), a primeira emissora comercial do país. Em 1936 assume a denominação de Rádio Caracas Rádio (RCR) e em 1953 aparece a Rádio Caracas Televisión (RCTV).

    Este grupo, encabeçado por Peter Bottone, como principal accionista e Marcel Granier Haydon, membro da família Phelps e de outras “possui mais de 80% do capital social de cinco empresas que operam na Venezuela” tais como a RCTV, FM, RCR, Recorland e Línea Aérea Aerotuy.

    As empresas onde o grupo não possui 100%, estão juridicamente associadas à estrangeira Coral Sea Inc. “A Coral Pictures, situada em Miami, comercializa a nível mundial a 1BC e embora em menor grau, tem a mesma estrutura de concentração da propriedade da ODC.

    Em terceiro lugar refere-se o Grupo Nuñez, Zuluaga, Mezerhane & Ravel, Globovisión. Os seus donos encabeçados por Luís Teófilo Nuñez Arisendi possui 89,9% do capital social do operador de sinal aberto Globovisión e a Monserrt SA detém o resto. Iniciou a sua actividade em 1994 e é o primeiro operador especializado em informação da Venezuela; além da sua ligação à imprensa escrita, tem ligações bancárias, turísticas em que as acções pertencem à empresa estrangeira Humbolt International Limited, detentora inúmeras agências de publicidade.

    Em quarto lugar os investigadores colocam o Bloque de Armas Meridiano TV – liderado por Andrés Armando e Martin De Armas Silva – com 100% do operador com o mesmo nome, que tem, além disso, um enorme poder nas indústrias de entretenimento, sendo o resto do capital social da Overseas Trading Investment SA que, por sua vez, é proprietária de jornais e revistas de desporto, entretenimento e da editorial Primavera SA, que edita textos escolares e revistas várias.

    Continuando a sequência, vem o Grupo Imagem La Tele, liderado por Fernando Fraíz Trapote, Elias Tarbay Assad e mais quatro sócios, alguns dos quais estão, por sua vez, na Administração da Operadora Cablevisión SA, “apesar de 100% das acções pertencerem à estrangeira Telecom Trading Corporation, ligada à Airtel.

    Este grupo “é operador de TV de sinal aberyo UHF, La Tele, que iniciou as suas emissões em Dezembro de 2002” e está ligado a diversas outras empresas muitas delas de publicidade.

    Finalmente refere-se o Grupo Camero Televen, formado por Cuatro Treinta CA, associada à Marbrid, empresa com sede no Panamá. Tem ligações ao jornal Quinto Dia, entre outros.

    Ainda que resumido, este é o esquema do poder mediático que impera na Venezuela, uma parte do poder económico com multimilionários lucros, agora incrementados com os recebimentos de Washington na guerra suja informativa contra o governo venezuelano.


    Nota: Para denunciar a campanha de meias verdades e muitas mentiras contra a Venezuela, a propósito da não renovação da licença à RCTV, um grupo de jovens mobilizou-se à volta do lema “Tirem as mãos da Venezuela” e criou um blog om o seguinte endereço: http://tirem-as-maos-da-venezuela.blogspot.com/

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